Houve outra vez outro verão

No meu último texto contei da minha aventura em Natal, Rio Grande do Norte. Não sei se por efeito do sol na cabeça ou o sal na pele, aconteceu de eu ser atacado por um clima de nostalgia que me jogou de volta lá para a década dos oitenta, quando tomei meu primeiro banho de mar.

Foi também num fim de ano. Eu morava em Porto Alegre havia ponto tempo e, como todo o guri saído da adolescência, não queria passar o réveillon com a família, de quem eu me queixava de caretice e opressão. Além disso, para todo lado que eu olhava só via gente se preparando para viajar, tirar férias. Contagiado pelo astral festivo, decidi que já era hora de conhecer lugares diferentes. E pra fugir de um mormaço típico de final de dezembro, após uma jornada de trabalho, juntei toda minha mochila, que consistia de uma barraca velha para uma pessoa, um calção de banho, um par de chinelos, e me lancei na estada rumo a Tramandaí, com a firme convicção de iniciar um novo ciclo abrindo novos horizontes. Por aí já se tem uma idéia de como eu vivia até então, que até Tramandaí significava uma possibilidade a ser explorada.

Em razão da brevidade do veraneio, um pouco por falta de experiência, outro pouco, talvez, por querer aproveitar tudo na primeira oportunidade, achei que não devia desperdiçar um único instante do passeio. E foi assim que, no primeiro canto do galo daquela data inesquecível, eu corri para o mar, como um filhote de tartaruga recém-descascado. Graças à petulância típica da idade, ignorei as precauções básicas de banhistas de praia. Aliás, até achava bobagem ver aqueles marmanjos se lambuzarem o corpo, como se fossem umas moças delicadas.  Para mostrar coragem e ousadia – coisas que os rapazes na adolescência se esmeram em fazer – olhava para todas aquelas pessoas com o desdém de quem já superou tais necessidades. E não arredei o pé da água, firme, com a pele exposta ao sol, que naquele dia era – isso eu jamais vou esquecer – 40 graus.

A bravura se manteve indômita até pelas duas da tarde, quando o tempo virou e se armou um temporal.  A essa altura, o que os raios de sol tinham se proposto a fazer na minha pele já tinham feito, e eu já me preocupava com os efeitos do meu atrevimento juvenil. O desespero começou com uma ardência e um vermelhão, que se esparramou da testa ao calcanhar. Logo a seguir, uma brusca queda de temperatura, provocada por uma chuva com vento, só serviu para agravar ainda mais a minha triste situação, que ainda estava por piorar. Sentindo que meu estado não era bom, refleti que a atitude mais sensata seria pegar o primeiro ônibus e voltar pra casa. Ao chegar na rodoviária de Porto Alegre, não atinei noutro caminho a não ser o do Pronto Socorro. Lá chegando, fui jogado dentro de uma banheira cheia de um líquido preparado pra essa ocasião. Depois, me enfiaram um tubo na veia, e assim eu terminei um primeiro de janeiro da década de oitenta. Quando despertei muitas horas depois, fiquei sabendo que por pouco eu consegui escapar de uma complicação renal bem mais grave. Liberado do hospital, embarquei noutra condução, mas agora em direção à casa da família, no interior, para me recuperar. Não era tão ruim assim.

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